participante 41

Vejo uma estrela. Se eu pusesse o óculos talvez visse mais; não enxergar estrelas o suficiente no céu é um erro meteorológico ou de psique?

Eu cresci em São Paulo, mas não essa do imaginário de concreto; eu cresci perto da Serra da Cantareira, e tinha que tomar cuidado para que macacos não roubassem meu lanche no intervalo do colégio. Aprendi a desconfiar desse é das coisas discursivo, quando descobri que não fazia parte da história do espaço em que vivia; e a necessidade de ser "tudo" isso ao invés de um traçado limitado.

O Gutemberg e o Francis; um casal que não sei o nome; um apartamento vazio; uma árvore alta com o tampo das frutas bicados; uma casa em demolição; uma casa com um quintal cheio de árvores, uma casa com piscina; uma casa com edícula; no andar de cima, uma família de origem japonesa, no andar de baixo a Marilena e a Lara que sempre ouvem o que eu estou ouvindo; no nono andar, a minha tia e meu tio e meu primo; na esquina meu ex-namorado e no prédio do lado o apartamento de minha irmã no quinto andar, e no sétimo o apartamento da mãe de outro ex namorado. Duas casas abaixo do meu prédio, minha professora de yoga, 3 casas acima uma moça que "cozinha para fora" baião de dois; descendo a rua o metrô Tucuruvi

No quinto andar uma vizinha que quase morreu acidentalmente porque dormiu e esqueceu a panela no fogão; no apartamento ao lado a mãe e uma filha muito assustadas com o covid; no primeiro andar o primeiro uma família do interior; no apartamento do lado deles um casal de enfermeiras, o apartamento do lado oposto nesse andar, um deles é um casal jovem, e o outro foi abandonado porque a dona morreu e ninguém veio abrir ou fez algo com ele.

Na rua da frente um casal que ia casar, mas o noivo de infartou e morreu; na rua de trás em uma das casas alguém é do pcc, especula-se

Do lado do meu prédio um centro espírita e de caridade - eles distribuem marmita

Uma igreja metodista, uma católica

3 estacionamentos

Uma sala de pilates; uma oficina de som de carro; 3 espaços de estética, um dentista, uma professora de canto

A Conceição - senhora que sempre morou na rua e sabe da vida de todo mundo

O cheiro perto da Serra é de Mato misturado com escapamento; sentido ao centro, toda a cidade cheira resíduo humano

O ventilador; a voz da vídeo-chamada; meus pés caminhando pelo chão de madeira da sala de dança

A subida pela augusta desde o jardim Europa depois do trabalho; lembro quando eu descobri, sem querer, perambulando, a vila do Flávio de Carvalho ali na Alameda Lorena. Eu não sabia bem o que era, mas voltava para perambular por ela sempre. Era perto de onde trabalhava, então gastava muito tempo depois do expediente descobrindo sorveterias, livrarias e casas de chá na região dos jardins.